Mesmo com a presença dos grandes latifúndios ma década de 40, Arapiraca possuía um verdadeiro cinturão verde circundando a cidade; sentia-se o cheiro da vegetação logo na saída das ruas, pois, ainda existia uma infinidade de ervas e frutas silvestres muito próximos do centro.
Contudo, quando Arapiraca conheceu a fase de desenvolvimento a partir de 1950, o aspecto geral mudou muito, tendo em vista a mutilação desencadeada, tanto na área urbana, como na zona rural do município, onde foi destruída muita vegetação nativa para dar lugar à cultura de fumo.
Assim, havia o sítio de Caititús, um recanto aprazível repleto de fruteiras: cajueiros, mangueiras, laranjeiras, goiabeiras, mamoeiros, cujos frutos eram consumidos pela família, vizinhos e amigos, pois naquela época não havia mercado. Hoje a cidade cresceu e absorveu os Caititús que, de sítio, passou a bairro.
A Serra dos Ferreira, um dos sítios mais antigos, foi onde se instalaram os Ferreiras de Cacimbinhas. Era um lugar agradável, com muitas árvores frutíferas, onde o capitão João Ferreira criava pavões em quantidade. Hoje está muito diferente, com a devastação que lhe foi imposta.
O Sítio Mocó, o reduto do velho Lúcio Gomes, foi o mais castigado pela evolução. Era no sítio Mocó que se realizavam animadas festas de fim de ano, freqüentadas pelos jovens da sociedade arapiraquense. Quando asfaltaram o trecho da AL – 102, ligando Arapiraca à Taquarana, o asfalto destruiu totalmente o sítio Mocó com a igreja, riscando-o do mapa do município.
A Lagoa de Dentro foi outro sítio que foi vítima da transformação ocorrida na zona rural, e praticamente foi eliminado, dando lugar a vastas plantações de capim para criação de gado. Era no passado o mais animado dos sítios e dava-se ao luxo de promover bailes carnavalescos, fazendo concorrência com o carnaval de Arapiraca. Naquele tempo se dizia que o povo de Lagoa de Dentro vivia de festa o ano inteiro.
A Baixa Grande era um sítio onde estavam radicadas as tradicionais famílias – raízes de Arapiraca: José Emídio, Alexandre, Honório, Estevão, Messias, Bernardino e outras, que realizavam o chamado “Derradeiro dia do fumo” e também animados pagodes do Gervásio. Existiam muitas fruteiras, onde o povo de Arapiraca costumava fazer passeios e piqueniques aos domingos e feriados. Suas festas de santos eram muito animadas.
O Sítio Fernandes era, talvez, o mais antigo e foi onde Manoel André foi buscar telhas para cobrir a primeira casa que construiu em Arapiraca. Era um celeiro de almocreves e de bons tocadores de pé-de-bonde, onde havia muitas festas. Coberto de frutas nativas e densa vegetação, do sítio, hoje, resta apenas um próspero distrito de Arapiraca.
O Sítio Guaribas era outro recanto muito animado e também um celeiro de frutas tropicais eu a juventude da época costumava freqüentar. Era lá que morava o velho Simão Lopes, figura boêmia e folclórica muito conhecida nas ruas de Arapiraca. Era um local onde o povo gostava de dança coco e cantar na colheita do fumo.
Entretanto, o sítio mais festejado e procurado pela meninada de então era o saudoso Poço frio, onde morava Né Magalhães, o velho Pedro Cavalcante e outros. Além das frutas comuns, existia uma infinidade de frutas silvestres como: umbu, jabuticaba quixaba, massaranduba, pinha brava, azeitona, gogóia, juá e principalmente araçá. Segundo informa Edson Raimundo, as sábias, eram tão gordas de tanto comer araçás, que quase não podiam voar. Foi outra vítima do progresso que devia ter sido poupada, pois foi a inútil barragem riacho Perucaba eliminou o Poço Frio.
O Sítio Capiatã era um dos recantos bucólicos cheio de fruteiras: foi onde o fogueteio Pedro Nunes edificou toda família onde terminou seus dias. Atualmente, com a corrida imobiliária, o sítio ficou ligado ao centro urbano através da rua Pedro Nunes de Albuquerque.
Mais adiante, vinha o sítio Macacos, com a Igrejinha da Menina, um local romântico onde o velho Beijo realizava a festa de São Pedro, com uma animado pagode até o amanhecer do dia.
Logo após, está o sítio Massaranduba, outrora coberto fruteiras, muita vegetação nativa e frutas silvestres. As festas na casa de Zé Vermelho, Luís Vicente, Tertuliano e as destalagens de folhas de fumo na casa do velho Euzébio, onde as moças cantavam o dia todo.
No Sítio Cavaco residiam Antonio Ventura, João Ventura, Luiz Alexandre, José Macário, João Lúcio da Silva, e mais adiante Né Ângelo, Pero Alexandre, José Rufino, João Rufino, João Alexandre dos Santos e outros.
Extraído do livro "Arapiraca através do tempo" do historiador Zezito Guedes.
Muito comum, no passado, era a presença das "bodegas" que...
AS BODEGAS
Muito comum, no passado, era a presença das "bodegas" que, geralmente, o povo usava como ponto de encontro.
Além da função comercial junto à comunidade, existia o fator comunicação. Era nos adjuntos de bodega que o povo falava do tempo, produção agrícola, mercado, carestia, política, religião, cangaço, nascimento, transitoriedade, vida alheia, as "novas" do dia, as "estórias de trancoso", como "a obra da raposa", que seu Ivo contava; as mentiras inventadas por Zé Lopes, ou as glosas que Simão Lopes, João Canário e Domingão improvisavam entre uma bicada e outra.
As reuniões nas bodegas constituiam uma hábito tradicional e, a partir dos anos 20, muitas bodegas ficaram famosas em Arapiraca. Na rua Nova (Pça. Marques da Silva) Toinho Rodrigues mantinha uma pequena bodega (não tinha bebidas), que era o ponto de encontro dos políticos: Tibúrcio Valeriano, José Lúcio da Silva, João Ribeiro Lima, Genésio Rodrigues, José Bernardino, Antonio Apolinário, entre outros. No final da rua Nova Domingos Romualdo possuia uma bodega sortida, onde reunia um bom número de fregueses para as conversas do dia. Na rua do Cedro esquina com a rua do Arame (Rua São Francisco), Manoel Petuba mantinha uma boa freguesia, onde o povo dava uma prosa diariamente. Na Boca da Caixa, Luiz Pereira Lima se estabeleceu, em 1929, com a bodega onde começou vendendo banana, pinha, jaca. Depois colocou algumas garrafas de aguardente, onde o povo daquela área fazia adjunto diariamente.
Na rua da Matança, André Félix instalou-se com uma bodega onde também reunia uma boa quantidade de fregueses, aí fazendo ponto de encontro todos os dias. Na rua do Cemitério também se estabeleceram José Iziano e Pedro Arisitides com o mesmo ramo de bodegas. Ainda na Rua do Cedro José Oliveira, que comprou o negócio de Manoel Petuba, manteve uma sortida bodega com boa freguesia durante muitos anos; essa bodega de balcão ensebado, algum tempo depois passaria para as mãos do velho Morais, onde a meninada da atual Av. Rio Branco comprava bananola, até o início dos anos 50.
Extraído do livro "Arapiraca através do tempo" do historiador Zezito Guedes.
A Cultura do Fumo
A região onde está situado o município de Arapiraca sempre cultivou cereais e a mandioca...
A CULTURA DO FUMO
A região onde está situado o município de Arapiraca sempre cultivou cereais e a mandioca sempre foi o seu principal produto desde 1848. A cultura do fumo foi iniciada nos últimos anos do século XIX e teve como pioneiro Francisco Magalhães que, acolhendo sugestões de um almocreve de Lagarto-SE, chamado Pedro Vieira de Meio que comerciava nas feiras da então vila de Arapiraca, plantou fumo pela primeira vez em um curral onde cuidava de gado no atual bairro de Cacimbas. Daí a expressão curral de fumo, ainda hoje empregada pelos plantadores de fumo da região, no seu primeiro estágio.
A plantação de fumo nos currais foi feita durante alguns anos, passando em seguida para os chamados bai~ios, no início deste século. Semeavam o fumo nos currais e, qúando a planta nascia, era mudada para canteiros nos referidos baixios; a muda de planta vem dessa época onde foi cultivada até o ano de 1922. Essa fase constitui o segundo estágio e, nessa época, além de Francisco Magalhães, já cultivavam o fumo seus irmãos Rosendo Magalhães, Manoel Magalhães, João Magalhães, Marcelino Magalhães e seus parentes Domingos Barbosa, Pedro Leão, Messias Bernardino, Tibúrcio Valeriano, Pedro Honorato, Ambrosino Lima, Vicente Correia, Manoel Leite, João Barbosa, Firmino Leite, João Ferreira e outros.
Em 1915, os fumicultores mais prósperos já plantavam até duas tarefas de fumo, aparecendo nesse ano o primeiro homem a armazenar o produto: José Bernardino compra a safra de alguns plantadores.
Muitos anos passaram cultivando fumo nos baixios e com métodos ainda primitivos, pois só no começo da década de 20 éque a cultura do fumo passaria a se desenvolver com mais intensidade, quando o filho do pioneiro Lino de Paula Magalhães, sentindo necessidade de aumentar o plantio, quebrou o tabu: fez a semeia no curral e daí mudou para a chã — terrenos mais altos - onde plantou uma tarefa e meia de fumo, usando um pouco de estrume de gado em cada planta, sendo este o terceiro estágio.
Em 1924, Arapiraca, já emancipada politicamente, apresenta notável desenvolvimento; a produção do fumo do município já abastece (em tropas de burros) as cidades circunvizinhas de Penedo, Igreja Nova, Limoeiro de Anadia, Quebrangulo, Viçosa, Palmeira dos Índios. É nesse época que os irmãos Né de Paula Magalhães e Deca Magalhães (por informação de Laudelino Barbosa que vira em uma de suas viagens) fazem inovações na fumicultura, adaptando nova técnica na preparação do fumo em rolo, antes enrolado no pé de um banco. Introduzem utensílios de madeira, como: macaca, moleque, banco, até então desconhecidos na região; também a secagem das folhas que até essa época era feita à sombra dos cajueiros, passou a ser em sequeiros; tudo isso contribuiu para a evolução da cultura fumageira, eliminando um sistema por demais rudimentar e anti-produtivo, implantando métodos que ainda hoje são empregados pelos fumicultores de Arapiraca.
Em 1928, o fumo em rolo era vendido pela primeira vez, para fora do Estado, ao Sr. José Tomáz de Caruaru-Pe. Em 1930, José Pedro Proteciano (apesar de assustado com a Revolução e com os cangaceiros) já carrega em tropas de burros para Águas Belas PE. Nesse ano Lino de Paula Magalhães aumenta a área de cultivo para dez tarefas, tornando-se o maior produtor do município de Arapiraca. Em 1934, falece o pioneiro Francisco Magalhães, mas os herdeiros assumem o comando e a esta altura, além dos plantadores já citados, plantam também Apapito Magalhães, Gregório Magalhães, Domingos Magalhães, Luiz Magalhães, Tibúrcio Magalhães, Domingos Lúcio da Silva, Rosendo Lima, Né Rosendo, Pedro Alexandre, José Lúcio da Silva, Manoel Leão, Rosendo Gama, João Nunes, Lino Barbosa, Manoel Lúcio Correia, Francisco Lúcio, Domingos Terto, Aprigio Jacinto, José Emídio, Gervásio Oliveira, José Honório, Pedro Romualdo, José Tertuliano, Domingos Honório, Antonio Leão, Domingos Romualdo, Lúcio José da Silva, Manoel Lúcio da Silva, Manoel Pereira Santos, João Lúcio da Silva, Antonio Ventura, Né Angelo, Izidro Leão, João Ventura, José Macário, Manoel Clarindo, José Ventura, André Leão, foram os principais plantadores de fumo desta fase, havendo quem plantasse até 20 tarefas.
Em abril de 1938, os cangaceiros passaram próximo a Arapiraca e Lampeão aprisionou Lino de Paula no sítio Fernandes, mas o fazendeiro empreendeu fuga espetacular livrando-se do bandoleiro. No ano seguinte tem início a 2a Guerra Mundial todavia esses fatos não arrefeceram o entusiasmo dos fumicultores que continuaram evoluindo a passos largos.
Em 1934 Manoel (Né) de Paula Magalhães se desloca para o Estado da Paraíba com sua família e seus primos José Leão,
Né Cavalcante, Laudelino Leite e Anatólio Leite ( que em 1945 inventou o carro usado na viração do fumo) onde seriam os pioneiros no cultivo de fumo na região de Araçá e Sapé.
Apesar do progresso registrado nessa época, a produção do município era ainda limitada e os compradores de toda produção do fumo em rolo eram José Tomáz, Manoel Targino, Miguel Dudu, José Medeiros, Dedi, Macário, Pedro Lau, os irmãos Vaqueiro, José Carvalho, Dóia, Arnô, Francisco Carvalho, Cecílio, Antônio Paulino, Pedro Pirraia, Augusto Paulino, Antonio Carvalho etc.
Em 1945, surge pela primeira vez o comércio de folhas: José Lúcio da Silva e Lino de Paula Magalhães se estabelecem com armazéns para compra de folhas. Surge também a primeira fábrica de charutos por intermédio de José Lúcio de Meio a “Fábrica de Charutos Leda”; no ano seguinte aumenta o comércio de folhas com a presença de Joel Esteves, o primeiro corretor baiano que se instalou em Arapiraca no após-guerra, comprando folhas para várias firmas da Bahia, como Mário Cravo, Suerdyk, João Martins Mamona. Daí por diante surgiram outros corretores como Francisco Machado, Pedro Figueredo, Valdomiro Barbosa.
Em 1949, seria fundado por José Lúcio de Meio o Clube dos Fumicultores de Arapiraca.
Em 1950, se instala em Arapiraca a primeira firma internacional, a Exportadora Garrido dirigida por Galeno. A partir daí, o desenvolvimento da cultura do fumo torna-se impressionante; mais da metade da população já planta fumo e mais uma vez modificou-se o sistema: Lino de Paula Magalhães por sugestão do Dr. Francisco Oiticica, faz algumas experiências e substitui o adubo orgânico (estrume) por adubo químico (tortas, salitre, etc.), sendo esse o quarto e último estágio. Arapiraca, a essa altura, já conta com créditos de várias agências bancárias e com uma cooperativa criada por Lourenço de Almeida, que a conduziu com sacrifício por muitos anos tentando dar alguma assistência aos fumicultores. Infelizmente essa cooperativa nunca atingiu o seu objetivo (vender a terra, financiar, comprar o produto, etc), obrigando dezenas de famílias a procurar a Cooperativa 13 em Lagarto-Sergipe, que tem procurado ajudar o pequeno produtor.
Esse período caracteriza-se por uma verdadeira corrida de firmas internacionais em busca de folhas; instalam-se novas firmas aparecendo os primeiros Gringos que se hospedavam no Hotel Lopes: Exportadora Bukovitz Ltda, Fraga & Sobel, Tabacalera do Brasil, C. Pimentel, Carleoni, Souza Cruz, cujo técnico Mr. James Reed, na época insistiu para que os fumicultores da região plantassem o fumo tipo amarelinho, qu.e produzia uma folha de qualidade especial; infelizmente todo esforço seria em vão,pois, essa espécie não servia para o fumo em rolo e assim seria mais vantagem para os fumicultores plantar de um tipo que desse para as duas coisas simultaneamente: para folha e rolo. E assim continuaram plantando as espécies mais comuns: rodoleiro, língua de vaca, rapé, orelha de burro, folhiço, verdão e outros. Logo após chegariam Amerino Portugal e Mangerroux, foram estas as primeiras firmas internacionais. Terminada a década de 50 aparece outra inovação importante: Edvaldo Nobre Magalhães enrola o fumo fino, que se adaptaria melhor aos consumidores do Sul — São Paulo, Paraná, porém, com uma mão de obra mais dispendiosa, pois, o rolo é formado com quatro pernas ou pavios; esse tipo de fumo é produzido apenas por uma minoria, dada as dificuldades técnicas. O fumo fino foi introduzido no comércio de São Paulo por intermédio do comerciante Antonio Pinto que comprou a safra do Sr. João Lopes em 1962 e foi lançado em Minas por José de Souza Guedes que vendeu a Lafaiete Pinto Mendes em Itanhandú.
À década de 60, surge como um período dos mais florescentes e muita gente dos mais variados ramos, fascinada pelos bons lucros se infiltrou no comércio de fumo sendo bem sucedida. Conseguiram essas pessoas, verdadeiras fortunas, ora armazenando o produto, ora comerciando fertilizantes e outros industrializando o fumo em rolo, como Valdomiro Barbosa, Francisco Pereira, Deca Moço, Norberto Severino, Eduardo Alves da Silva, Aurelino Ferreira Barbosa, José Alexandre, Severino Araujo Silva, Mário Lima e outros.
Essa fase foi realmente das mais promissoras; a cultura do fumo passou a ocupar toda a área do município de Arapiraca e começou a penetrar nos municípios circunvizinhos: Limoeiro de Anadia, Feira Grande, Junqueiro, Coité do Nóia, Taquarana, São Sebastião, Campo Grande, Girau do Ponciano, Igací, que foram atraídos pelos bons rendimentos do chamado ouro preto. Atualmente, a região de Arapiraca já se encontra carente de vegetação. O clima já começa a mudar e o desequilíbrio ecológico épatente; a precipitação de chuvas que outrora ocorria regular-mente, hoje já não ocorre e como c.onsequência disto, as safras, às vezes, são prejudicadas; mesmo assim, o município de Arapiraca ainda continua sendo um dos maiores parques fumageiros da América Latina e milhares de toneladas de folhas são exportadas para o exterior, tendo como principal produtor-exportador Eloísio Barbosa Lopes, com a média de mil e trezentas tarefas anuais, isto sem contar com o fumo em rolo que abastece quase todo Nordeste e parte do Sul do Brasil.
Grande quantidade de fumo ainda é industrializada .em firmas de Arapiraca, tais como: Fumo Rei do Nordeste, Fumo Extra Forte, Fumo Du-Melhor, Fumo Super-Bom, Fumo Jangadeiro, Fumo Jóia, Fumo Sempre Forte, Fumo Império, Fumo Extra Bom, etc. (indústrias de fumo picado e condicionado em embalagens plásticas)
Conforme dados estatísticos do I.B.G.E., a população do município de Arapiraca nas últimas décadas era a seguinte:
1940 25.514 habitantes
1950 37.073
1960 46.715
1970 94.287
1978 (estimativa) 140. 000
Possuindo uma área de 614 Km², é Arapiraca a cidade líder no Estado de Alagoas e a que mais cresce no Nordeste, construindo 08 (oito) casas por dia.
Apesar do progresso observado em Arapiraca e da evolução tecnológica nesses últimos anos, a produção do fumo em rolo ainda não tem um mercado certo não havendo portanto um escoamento para toda a produção; também ainda continua com os mesmos métodos introduzidos pelos pioneiros na década de 20:semeia, muda, plantação, varais, sequeiros, mão de obra para fazer o rolo; não conseguindo sequer debelar uma praga conhecida por “Meia” (espécie de lôdo ou môfo), que destrói todos os anos as sementeiras, ocasionando sérios prejuízos aos plantadores; as inovações foram restritas: a permuta do estrume pelo adubo químico em 1953, o aparecimento do fumo em quatro pernas em 1962, a introdução da máquina no preparo da terra no início da década de 70, através de Eloísio Barbosa Lopes e alguma modificação na secagem de folhas. Excetuando isto, 70% da colheita ainda continua sendo manual, o que onera excessivamente o produto, obrigando alguns a partir de 1970 a investir em outras áreas como: pecuária, loteamento de imóveis, cultivo de mandioca, plantação de abacaxi, cerâmica (João Lúcio da Silva, José Maia, José Leão, Eloísio Barbosa Lopes e outros) que evitaram a monocultura.
Ocorre também na década de 70, outra profunda modificação: além da meiação, acaba-se pouco a pouco o sistema de moradores implantado ainda na década de 30; ao invés de dar a morada no terreno, o proprietário prefere pagar ao trabalhador por produção, mesmo transportando-o diariamente para o local da colheita, livrando-se dessa maneira das obrigações sindicais:terminada a colheita, logicamente, termina o vínculo com o trabalhador que geralmente se desloca para a região dos canaviais. As relações entre patrão e trabalhador, como acontece na agricultura, nunca chegaram a bom termo, apesar da presença do órgão trabalhista. Se por um lado o patrão nega-se a assinar a carteira do trabalhador ou se esquiva em mantê-lo durante o verão, o trabalhador por seu turno, uma vez com a carteira assinada, julga-se com direito a abusar, não trabalhar, prejudicar a colheita, etc. E quando procura o Sindicato Rural este o defende, porém prejudica-o pois ele não consegue mais trabalho em outras fazendas, ninguém o quer. E um problema insolúvel até agora e acreditamos ser muito difícil se encontrar um denominador comum, seria no caso, mudar uma mentalidade secular.
As Cantigas
Com a expansão da cultura do fumo em Arapiraca, a partir da década de 20, cresceu, também a necessidade de mão de obra...
CANTIGAS DAS DESTALADEIRAS
Com a expansão da cultura do fumo em Arapiraca, a partir da década de 20, cresceu, também a necessidade de mão de obra e assim convergiram para Arapiraca trabalhadores de várias regiões do Nordeste, que foram trazendo em suas bagagens, costumes, folguedos, crendices. seitas, cantos, os quais foram se adaptando à primitiva cultura já existente e assim se concentrou um sem número de cantigas que há mais de meio século são cantadas na épocas da colheita de fumo pelas mulheres que retiram os talos das folhas de fumo as conhecidas destaladeiras de fumo.
Estando o município de Arapiraca, situado no Agreste Alagoano, entre a Zona da Mata e a do Sertão, essas regiões muito contribuiram e exerceram grande influência na formação dessas cantigas utilizadas na colheita. Na Mata, temos o côco, a cantiga de roda, o reizado; no Sertão, o aboio, a toada, a cantoria de viola, a cantiga de eito. Todas essas manifestações folclóricas influiram decisivamente na formação das cantigas de salão de fumo que as mulheres entoam, sentadas no chão, afastando o sono enquanto destalam as foihas e qu.e, com o passar de tempo, foram adquirindo características próprias, constituindo uma manifestação do povo da região fumageira.
As primeiras cantigas que apareceram em Arapiraca, foram dedicadas aos plantadores de fumo da época:
“ Seu Né “Seu Né de Paula
Seu Né Se parece um raio de sol
Só brinca hoje Quando vem chegando
Na fazenda se quisé” Na fazenda Seridó”
“ Seu Né de Paula
Com todas trabaiadeira
Seu Toinho Cavalcante
Enrola fumo na carreira”
“ Fazenda Pernambucana
Fazenda que tem valô
Ela paga e não engana
Só ganha quem trabaiô”
Essas últimas estrofes fazem referências as Fazendas e aos primeiros enroladores que atuavam nos salões de fumo, junto as destaladeiras: Toinho Cavalcante, Juca Magalhães, Rubens Pedro, Zezé, Sulino, José Macário, José Vermelho e outros.
Entoando essas cantigas, muitas cantadeiras marcaram época nos salões onde cantavam, tirando os versos: Maria de Lima Araújo, Rosa Leite, Detinha, no bairro de Cacimbas. Maria Julieta, Maria Neuza, Amália, Luzia, Rosa Macário, no bairro de Baixa Grande; Joana, Regina, Nina Vital, no Alto do Cruzeiro; Júlia, Rosália, Maria de Lourdes, Angelita, no sítio Mangabeira; Alice Alves, na Lagoa da Pedra; Lourdes Zacarias, Zeza, na Fazenda Pernambucana. Essas cantigas em formas de trovas, (rimas ABCB), sem acompanhamentos musicais, são entoadas em várias vozes, formando um coro harmonioso no estribilho (refrão), com uma só voz no improviso dos versos geralmente tirado pelas líderes do salão. Se o refrão da cantiga agrada em cheio, elas cantam até durante horas; mas, normalmente, as desL taladeiras mudam de cantiga para não esfriar o entusiasmo:
“ Essa cantiga já tá véia
Tá boa de remendá
Com taquinho de pano novo
Uma agúia e um dedá”
“ Eu não como ceará
Nem também carne de péia
Arrenove essa cantiga
Que já tá ficando véia”
E assim elas estimulam cada vez mais, mantêm o salão em permanente alegria, evitando o tédio ou o sono, usando sátiras, ironias, chistes, gracejos espirituosos que são mais das vezes interrompidos por uma algazarra geral:
“ Eu não quero me casá
Com rapaz pequenininho
Prá botar ele no braço
Tururú meu macaquinho”
“Meu amó era um cachorro De cachorro virou gente Mas como não tem palavra
“ Menino casa comigo
Que nós não morre de fome
Minha mãe tem uma porca véla
Quando ela matá nós come”
“Eu agora vou casá
Se eu casá eu vivo bem Se eu ficá no caritá
E principalmente versos românticos impregnados de lirísmo, reminiscências puras do romântismo do século passado que o sertão nordestino conservou talvez como nenhuma outra região brasileira e que são geralmente dedicados pelas destaladeiras aos rapazes solteiros — bem amados — alguns de rara beleza, verdadeiros poemas conforme podemos observar:
“ Eu tranquei na mão um riso
De tua boca mimosa
Quando eu fui abrir a mão
Tava toda cor de rosa”
“Essa noite choveu ouro
Prata fina orvaiou
Eu não aonde tava
Meu sentido aonde andou”
“ Já fui cravo, já fui rosa
Já fui de teu coração
Hoje sou a vassourinha
Com que vais varrê o chão”
“As estrela do céu corre
Eu também quero corrê
Elas corre atrás da lua
Eu atrás de bem querê”
Existe ainda os versos que as destaladeiras empregam para chamar alguém, fazer interrupções, pedidos, insinuações, junto aos proprietários como observamos nessas estrofes:
“ Patrão eu quero bebê
Na vida eu tenho prazê
Se eu não bebê
Eu vou-me imbora”
“Feche a porta e abra a porta
Sem bulir na fechadura
Se eu fosse o dono do fumo
Oferecia rapadura”
“ Eu plantei um pé de cana
Nasceu um pé de ananá
Seu eu fosse o dono do fumo
Oferecia guaraná”
“Quem não pode com a formiga
Não assanha o formigueiro
Quem não pode dar o vinho
Não se mete a ser meeiro”
Muito usados também eram os chamados versos de maltratar que as destaladeiras cantam quando querem xingar alguém que não mais desejam:
“ No tempo que eu te amava
Rompia matas de espinho
Hoje eu pago com dinheiro
Para não vê o teu focinho”
“Eu plantei um pé de cravo
Nasceu um pé de jasmin
Num namoro rapaz branco
Do cabelo de tuim”
“ Quem quisé comprar eu vendo
Um amor que já foi meu
Uma banda tá inteira
E outra a barata roeu”
“Lá do céu caiu um cravo
Choviscadinho de amarelo
Menino interessa a mim
Mas amor eu não te quero”
Nas cantigas das destaladeiras observamos os mais variados temas: do lírico ao sarcástico, do satírico ao irreverente, do espirituoso ao chamado verso de roedeira, que também é conhecido como paixão recolhida.
Como acontece com várias manifestações folclóricas, as destaladeiras também gostam de render homenagens, fazer louvações a lugares, a proprietários, algum visitante, em versos improvisados nos salões de fumo, conforme observamos a seguir:
“ Arapiraca é terra boa
Todo mundo diz que é
Terra de mulé bonita
Viva Manoé André”
“Mandei carta p’ro Recife
Biête p’ra Maceió
Tô amando um moreninho
Da parte que nasce o só”
“ Se o canário bem subesse
Quanto custa uma saudade
Não cantava em minha vista
As quatro hora da tarde”
“O passarinho avoou
Se sentou na verde rama
Mando-te dizer ingrato
De longe também se ama”
Viva o cravo, viva a rosa
Viva com toda roseira
Viva o dono do fumo
Com todas trabaiadeira”
“Oh que estrela tão bonita
Do lado de Muricí
Só comparo aquela estrela
Com uma pessoa d’aqui”
“ Vai-te carta que te mando
Por esse mundo sem fim
Perguntá a meu benzinho
Se ainda lembra de mim”
“Quem me dera eu vê hoje
Quem tá em meu pensamento
Meu coração toma um susto
Meu corpo toma um alento”
Um fato curioso no entanto, nos chama a atenção nessa pesquisa: não conseguimos registrar um só verso contendo reclamações ou desprezo pelo trabalho, não há lamentações nas cantigas da colheita de fumo, daí concluimos que existe um grande contentamento no ambiente onde elas executam a tarefa:
“ O galo cantou, cantou, moreninha
O dia manheceu, manheceu
Hoje aqui neste salão, moreninha
Quem canta mió é eu”
“ O cantá da meia noite
É um cantá incelente
Acorda quem tá dormindo
Alegra quem tá doente”
Os temas empregados no apogeu dessas cantigas, nas décadas de 40 e 50, retratavam o meio ecológico da época : árvores, frutas, flores, pássaros, açúdes, que ainda não tinham sido devastados pelo homem, para dar lugar a cultura do fumo conforme registramos:
“Quem namora moça gorda Vai topá com satanáz Quando ela sai na rua
“ Moça que ama chof éAma cachorro também Cachorro ainda tem rabo
“Bananeira tá de luto
Descanso dos passarinhos As folhas de sentimento
Quem me dera eu descansá Bem que disse a bananeira
Nos teus braços um bucadinho” Quem amô tem tormento”
“ Cravo não me chame rosa “A sucena me fez queixa
Que o meu tempo já passou Que sua rama murchou
Me chame laranja verde Eu também fiz queixa a ela
Da gáia que não vingou” Que meu amô se acabou”
Nos últimos tempos nota-se perfeitamente a presença de elementos urbanos, sinais, símbolos, da chamada sociedade de consumo, conforme observamos nas estrofes seguintes:
“As folhas da bananeira
De manhã manhece queta
Eu conheço meu benzinho
Lá vai meu bujão de gáz” Quando vem de bicicreta”
“Eu preguei o teu retrato
Numa lata de manteiga
Sem vergonha é rapaz branco
E chofé nem rabo tem” Que namora com uma nêga”
Também convém ressaltar que muitas dessas cantigas de salão de fumo já foram publicadas em jornais, plagiadas e até gravadas com modificação da letra, da música e do rítmo. Mas, essas cantigas são anônimas, produtos da invenção do povo simples da roça.
E assim, as mulheres trabalham melhor durante horas àfio, na destalagem e seleção das folhas para formar o rolo, em salas, salões ou armazéns utilizados para a tarefa. Essas “cantigas de salão de fumo” como são conhecidas em Arapiraca, sempre constituiram uma grande atração na época da colheita, quando uma intensa alegria tomava conta dos salões e ouvia-se a longa distância, a cantilena das “destaladeiras”. É pena que essas cantigas autênticas manifestações, tão apreciadas pelo povo, não continuem com a mesma freqüência do passado, vítimas que foram da própria evolução tecnológica implantada na região nos últimos anos da década de 50, quando em Arapiraca se instalaram importantes firmas internacionais que passaram a explorar o comércio de folhas de fumo, proibindo as “destaladeiras” de cantar no trabalho de seleção das folhas, alegando que, além de fazerem barulho, diminuiam a produção diária dos armazéns. Hoje, elas trabalham caladas nos armazéns, sem conversar ou fazer qualquer ruído.
As cantigas tiveram o seu período áureo nas décadas de 40 e 50; até o ano de 1959 as “destaladeiras” cantavam muito nos salões de fumo em pleno centro da cidade e até jovens da elite de Arapiraca, misturavam-se com as mulheres na destalagem do fumo e se deleitavam cantando versos de amor o dia inteiro, numa alegria contagiante e que atingia o seu ponto máximo no chamado derradeiro dia de fumo, quando era encerrada a destalação da safra e o patrão oferecia uma buchada de um carneiro gordo, bem como um “forró” acompanhado ao som de harmônica e muita bebida para comemorar o encerramento da colheita. Foram dias memoráveis os derradeiros dias de fumo nos salões de Né de Paula Magalhães, na Fazenda Seridó, Lino de Paula Magalhães, na Fazenda Ouro Preto, Luis Pereira Lima, na Fazenda Pernambucana, João Lopes, José Honorato, José Imi-. dio, Né Angelo, João Ventura, Pedro Alexandre, Domingos Honório, Gervásio Oliveira que ofer.ecia também um pagode. Eram verdadeiras festas, com os salões enfeitados e as “destaladeiras” bem inspiradas com o vinho, cantando os versos de despedida:
“ Rapaziada adeus, adeus “Adeus amante querido
Adeus, adeus que já me vou Adeus porta de meus pais
Eu levo pena e saudade Só venho aqui para o ano
Dos moreno que ficou” Por hoje não canto mais”
“ Adeus cajueiro “Despedida meu bem despedida
Adeus cajuí A nossa função se acabou
Adeus que eu vou-me imbora Vamos deixá para o ano
Para o ano eu volto aqui” Se nós todos vivo for”
À noite começava o forró com o salão repleto de trabalhadeiras, a poeira cobrindo ía até ao amanhecer do outro dia, ao som dos pés de bode de João Chico, Odilon Zumba, Lau Catenga, João Pernambucano.
Atualmente, apenas em alguns pontos da zona rural da região fumageira, as mulheres ainda cantam na destalação das folhas de fumo, porém, os proprietários quase não realizam festas comemorando o final da safra; também observa-se claramente que o processo tecnológico já se faz presente: muitos fumicultores utilizando automóveis, já entregam as folhas de fumo à domídiio e as recolhem no fim do dia; logicam.ente as mulheres não se reunem em salões para cantar. Também já penetraram até nos sítios o rádio, o gravador, a televisão, que irão fatalmente, eliminar uma das últimas formas de canto de trabalho que ainda existe no Brasil, impondo uma inevitável transformação na cultura do povo.
Hoje, com essas anotações, estamos tentando fazer um modesto registro dessas cantigas da colhejta de fumo de Arapiraca, para que elas não desapareçam com o passar do tempo. Esta pesquisa, entretanto, contém apenas uma amostragem com algumas cantigas e os versos tirados pelas cantadeiras dos salões da “Terra do Fumo”, a progressista Arapiraca.
Extraído - com autorização do autor - do Livro A Cantiga da Destaladeira de Fum de Arapiraca - do historiador Zezito Guedes